Em 1964, o
escritor norte-americano Gene Roddenberry (1921-1991) gravou o primeiro
episódio-piloto de uma série que se tornaria um clássico e inauguraria
uma das mais bem sucedidas franquias do mundo, um verdadeiro ícone da
cultura contemporânea: Star Trek, ou Jornada nas Estrelas aqui no Brasil.
Mas
o início foi um pouco difícil. Os produtores da rede NBC acharam o
episódio-piloto cerebral demais, mas deram a oportunidade raríssima de
que Roddenberry promovesse algumas alterações e apresentasse outro
piloto, que acabou sendo aprovado.
No dia 8 de Setembro de 1966, o episódio
“O Sal da Terra” (The Man Trap) foi ao ar pela NBC, dando início à
missão de cinco anos da nave estelar Enterprise, para explorar estranhos
novos mundos e novas civilizações, audaciosamente indo onde nenhum
homem jamais esteve.
Os cinco anos originalmente imaginados
por Roddenberry já são 45. E, graças a um “reboot” na franquia de filmes
idealizado pelo cineasta J.J. Abrams, não há sinal que a viagem algum
dia terminará. Cinco séries de televisão, 11 filmes (com o 12º em
pré-produção), uma série animada, muitas convenções, livros,
documentários… Tudo leva a crer que o futuro da franquia será longo e
próspero.
A Série Original
O fenômeno de Star Trek começou em 1966 com a produção chamada Jornada nas Estrelas – A Série Original.
Ambientada no planeta Terra, século 23, ela conta a história de um
capitão e sua tripulação durante uma missão de cinco anos a bordo da
nave estelar USS Enterprise.
Jornada nas Estrelas é
resultado de uma nova concepção de futuro, uma visão otimista do homem e
da sua evolução. É um futuro em que o homem, através da história,
superou a fome, a ambição, as doenças e, sobretudo, a ideia exagerada de
possuir bens materiais, algo que o deixou livre para buscar seu
desenvolvimento moral. Em Jornada nas Estrelas, a
humanidade explora o Universo à procura de respostas e relações com
outras culturas. A imagem predominante é a do progresso, o triunfo do
homem, uma imagem que certamente estava em crise em 1966, quando a série
foi criada.
A USS Enterprise tem o comando do
Capitão James Tiberius Kirk (William Shatner). Entre os principais
tripulantes, estão o Sr. Spock (Leonard Nimoy) – um alienígena vulcano
de orelhas pontudas – e o médico-responsável Dr. Leonard McCoy (DeForest
Kelley, 1920-1999). Este trio é a alma da série, onde ocorrem
interessantes discussões entre o emotivo McCoy e o lógico Spock,
equilibrados por um capitão que é a soma de suas qualidades. Completando
a tripulação, há o engenheiro-chefe escocês Montgomery Scott (James
Doohan, 1920-2005) – responsável pelas máquinas da nave -, a oficial de
comunicações Tenente Nyota Uhura (a negra Nichelle Nichols), o timoneiro
oriental Hikaru Sulu (George Takei) e o jovem navegador russo Pavel
Chekov Ensign (Walter Koenig), que é o oficial de navegação da
Enterprise. Esta foi uma ousada diversidade étnica, promovida em plena
época de Guerra Fria e de conflitos raciais dos anos 1960. Foi a
primeira vez que uma série americana incluiu um personagem russo que não
fosse inimigo, o que reafirma a ideia de um futuro em que a humanidade
está vinculada.
O
planeta Terra usufrui a paz e a prosperidade em uma sociedade única,
sem fronteiras e de um só governo. Não há mais guerras, racismo ou
pobreza. Os terráqueos deveriam agora buscar o desconhecido, como forma
de aprimorar ainda mais sua sociedade e seu conhecimento. Com isso, a
Terra passou a fazer parte da Federação Unida de Planetas, que mantém um
intercâmbio de paz, troca de informações científicas, realizando um
comércio de produtos manufaturados e minerais entre os planetas.
O braço militar da federação é a Frota
Estelar, com a missão de descobrir novos mundos e novas civilizações. A
Frota Estelar é regida por um conjunto de 24 diretrizes. A Primeira – e
mais importante – proíbe interferências em outras culturas e no
desenvolvimento de qualquer sociedade. A Frota apenas age militarmente
em casos onde a defesa é crucial. Sua missão mais importante é manter a
paz, mais uma vez, algo que foi muito pregado nos anos 1960, após a
Segunda Guerra Mundial.
Os principais inimigos da Federação são
superorganizações de escopo semelhante à terrestre. As mais notáveis são
os impérios, especialmente o Império Klingon, o Império Romulano e o
Império Cardassiano. Normalmente, os conflitos entre a Federação e os
impérios têm como foco a importância da democracia sobre a opressão
totalitária.
O caráter humanista é uma das principais características da série original de Jornada nas Estrelas,
que mesmo repleta de tecnologia futurista, como o teletransporte ou
armas “phaser”, seu foco foi, na verdade, os conflitos dos anos 1960,
como o racismo ou o movimento Hippie. Disfarçados pela ficção, temas
como estes passaram pela censura americana e acabavam sendo captados
pelo público, mesmo que lentamente. Inovadora, a produção ousou até
mesmo o primeiro beijo inter-racial da tevê. No Brasil, na década de
1960, a mini-saia da Tenente Uhura fez com que a Censura Federal só
liberasse a exibição de Jornada nas Estrelas para após as 23h.
Apesar de todo o sucesso que a série iria obter ao longo dos anos seguintes, Jornada nas Estrelas
não agradou ao grande público americano em sua estreia. Inclusive,
segundo uma lenda, o pai do produtor Gene Roddenberry pediu desculpas a
alguns de seus vizinhos pelo fracasso da série. Mas um público fiel deu a
audiência necessária para a produção de duas temporadas, além de uma
terceira e derradeira em 1969, que só aconteceu devido pelos esforços
iniciais do casal “trekker” John e Bjo Trimble, que organizaram uma
campanha popular para salvar a série, com o apoio do próprio Gene
Roddenberry. A NBC recebeu milhares de cartas e deixou os executivos
impressionados.
Durante os anos 1970, enquanto emissoras locais americanas promoviam sucessivas reprises de Jornada nas Estrelas
(tipo de exibição conhecida por “syndication”), o instituto medidor da
audiência americana alterou sua metodologia de apuração e descobriu que a
série realmente não tinha uma audiência estupenda, mas atingia
exatamente o público que a rede NBC queria – jovens adultos do sexo
masculino, com bom poder aquisitivo. Em meio a diversas convenções
organizadas por fãs, verificou-se que a série havia virado mania e a
produtora Paramount, que considerou o cancelamento de Jornada nas Estrelas
como um erro, partiu para novas produções da franquia. A retomada da
produção da série era inviável e fazer uma versão animada pareceu a
melhor solução para Gene Roddenbery
Nenhum comentário:
Postar um comentário